quarta-feira, 9 de março de 2016

Um melhor dia das mulheres



já passou o dia, mas ainda em tempo

Após ver tantos textos sobre o dia das mulheres, campanhas boas, falas fracas e etc, senti a necessidade de me expressar sobre o dia. 

Não por mal eu não fiz o que costumava fazer de procurar varias mulheres na minha rede social para desejar-lhes feliz dia das mulheres, tampouco  sai distribuindo sorrisos e chocolates e rosas e "bom dia, feliz dia das mulheres" na rua (quem ve até pensa q eu sou tao sociavel assim). Mas resolvi passar o dia, e mais especialmente a noite, observando. Na verdade esse é um exercício que tenho feito a algum tempo e alguns momentos me chamaram muito a atenção. Momentos que ocorreram com amigas, momentos que ocorreram com desconhecidas e mesmo que eu tenha imaginado, mesmo que eu tenha exagerado convido todo mundo que ler esse texto a fazer um exercicio de abstração. Imaginem isso por um minuto da forma que eu falar aqui e quem sabe isso ajude-nos a entender um pouco mais esse dia (ontem).

Se posso resumir rapidamente o sentimento que eu vi, mesmo que por um relance nesses casos era o medo, como o medo brilhando nos olhos de uma moça de um bairro de São Paulo para qual fui pedir informação. Não percebi que já entardecia, não percebi que a rua estava deserta alem de nós, mas percebi momentaneamente o pânico nos olhos da mulher.. o pânico de estar sozinha numa rua com um desconhecido.. e nunca isso passaria na minha mente de ser uma "ameaça" a alguem, não fosse esse caso. Em um momento ela se encolheu, olhou de maneira rapida e desesperada para o chão como quem se prepara para levar uma pancada e tentou desviar de mim como quem entra de ombro numa tempestade. Tudo que eu queria era saber a posição da padaria mais proxima. (Aos curiosos, eu ascenei e a uma distancia de pouco mais de 5 metros pedi licença e perguntei o que queria da forma mais doce que pude)

Esse medo é sintomático, os mais conservadores me diriam que é um caso isolado e a segurança é uma preocupação de homens e mulheres mas após observar assim por diversos dias, posso assegurar que esse medo quase que exclusivamente vi em mulheres.. quase uma paranóia coletiva (apesar de não gostar do termo aqui).. e é inegavel que isso também é sintomático. Um sintoma da sociedade inteira, a cultura de terror (do estupro, da objetificação, o machismo num geral).
Passo então para um outro caso, de ontem mesmo, ao ver uma familia conversando num restaurante. Pai e filho estavam em uma posição muito semelhante, arcados pra frente assistindo a uma TV no local, cabeça apoiada nas mãos, quase a postos, tensos, rostos vermelhos e dentes cerrados. A filha abraçava-se a mãe, corpo encolhido e ombros pra frente, rosto meio escondido, parecia procurar proteção. Proteção do que? Apostaria minhas fichas que parte era tédio, mas duvido que o filho se portaria da mesma no tédio. A outra parte porem, como eu disse acima, se assemelha ao sentimento de impotência, de medo. Mas não faz sentido nessa situação, não é? Por que ter medo se não está acontecendo nada?

Percebamos que ao filho é ensinado (via exemplo) a ser agressivo, pronto sempre pra levantar-se e gritar gol ou gritar com alguem para defender sua vontade. A filha é ensinado a posição passiva e cheia de vergonha, ombros pra dentro, olhos no chão. A agressividade alheia, mesmo que não usada para agredir ainda sim deixa muitas marcas na formação pessoal. Expandindo essa situação pode-se dizer de um medo constante da agressividade social, permeando as mulheres a todo momento.
E para pontuar isso, gostaria de lembrar de alguns detalhes de um evento que compareci ontem mesmo no Mineirão, intitulado "De Frente Pro Lance: Mulheres no Futebol" , onde 5 Mulheres bem sucedidas numa área tão machista, mediadas por uma sexta mulher igualmente incrível, debateram sobre o assunto. E uma coisa que marcou muito a conversa delas é que todas negaram (ou pareceram negar) sofrer com preconceitos no mundo profissional. Mais tarde com uma frase longa e emocionada uma mulher, membro da plateia, disse sentir-se decepcionada por sentir na pele esse medo e não ver isso nelas. Numa mudança de postura todas se retrataram dizendo algo semelhante a "existe sim o preconceito, mas nós não demos atenção".

Muito embora isso me lembre em bom tamanho o Recalque da psicanálise visto em alguns outros casos de famosos que transcenderam seu status social original, o principal ponto que quero chamar a atenção do que isso em termos práticos significa. Para ter o espaço nessa area profissional (e posso assegurar facilmente que em diversas outras) a mulher tem que estar disposta a passar por cima de perguntas de validação (você é a secretaria dele? Cadê ele?) e outros pequenos fatos degradantes e desgastantes e humilhantes (conseguiu aumento pq deu mole pro chefe; Teste do sofá; Você com uma roupa assim não consigo trabalhar) alem de ter conhecimentos postos a prova tanto quanto ou até mais que seus concorrentes do sexo masculino. Ai está uma desigualdade clara, essas mulheres bem sucedidas tiveram que ter uma força e estabilidade emocionais muito alem do esperado para homens para poder estar NO MESMO LUGAR. Por isso elas foram exceções nas quais os planetas se alinharam de forma ideal para que elas tivessem uma chance de trabalhar muito, ralar muito como elas mesmo disseram. (espero sinceramente que elas leiam isso)

Isso foi o fruto da minha reflexão nos últimos dias, e após tudo isso eu não vou apenas desejar um feliz dia das mulheres (atrasado)  mas desejar um dia das mulheres melhor. Melhor que ontem, melhor que  o do ano passado, melhor ainda no ano que vem. Com menos motivos para ter medo, com mais "exceções" de sucesso. E que todos os corajosos que chegaram até aqui nessa reflexão se juntem a mim para refletir da mesma forma no ano que vem e descobrir se tivemos (a sociedade como um todo) um melhor dia das mulheres.

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